O que faz um bom surfista?
Certamente ele não produz as ondas nem escolhe a forma ou o caminho que elas irão percorrer. Um bom surfista é, em primeiro lugar, um excelente observador. Como em qualquer esporte ou trabalho, são necessárias horas de prática até que a pessoa comece a ‘entrar na onda’.
Na minha leitura, um bom surfista se forma dos diversos conhecimentos: das marés, tipo e características da prancha, temperatura da água, leitura dos ventos, estação do ano; de exaustivas (ou, melhor dizendo, divertidas) horas de prática; e uma profunda entrega sobre as impressões que seu coração lhe transmite sobre ‘como escolher a melhor próxima onda’. Em última instância, um bom surfista se forma do balanço adequado de todas estas habilidades. O equilíbrio entre razão, emoção e experiência.
Ainda falando sobre ondas, na área de marketing, desde o início dos anos 2000, uma grande onda vem se formando. Esta onda chama-se “Privacidade de Dados de Clientes”.
Alguns ventos e marolas vem indicando insistentemente onde e quando esta onda vai quebrar. Seu percurso… difícil de prever. Em alguns locais do mundo ela já se mostrou. Eventualmente de maneira mais branda ou mais severa. Uma referência que o Brasil tem usado é a Europa, que já se pronunciou a respeito.
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Nos Estados Unidos, referência (com alguns questionamentos) sobre as relações de consumo, o primeiro movimento desta grande onda foi a lei nacional de Do Not Call, seguida anos depois por vários estados no Brasil através dos Procon Estaduais.
O tema Privacidade de Dados não é, portanto, exatamente recente. O que tem mudado é o fato de que as informações de clientes (ou possíveis clientes) estão cada vez mais acessíveis às marcas.
A pergunta relevante neste momento é ‘Por que as informações de clientes se tornaram um ativo tão valioso a ponto de serem citados em contratos e eventualmente nos balanços das empresas? ”
Se você já navegou pelo mercado financeiro, deve saber que a análise técnica é baseada em complexos modelos estatísticos. Isto significa que estatística aplicada não é algo novo no dia a dia das empresas e das pessoas. O uso deste mesmo conhecimentovem crescendo silenciosamente na área de marketing das empresas. Por ser algo extremamente técnico e não trivial, poucas empresas têm a capacidade de utilizar da melhor forma esta grande ferramenta.
Considerando que Big Data é a soma de Volume de Informação + Diversidade de Dados + Capacidade Analítica, o que boa parte das empresas tem conseguido fazer até o momento é simplesmente juntar dados – sabendo intuitivamente que isto é, de alguma forma, importante.
E o que acontece quando uma empresa consegue atender a estas três pernas do Big Data? Uma das poucas empresas que conseguiu realmente atender seriamente a estes três quesitos ganhou alguma fama. Talvez você já tenha ouvido falar: chama-se Google.
Engana-se quem pensa que Big Data é coisa para gente muuuuuuito grande. A diferença do Google para a empresa média na utilização de dados – digamos assim, é que os dados são parte integrante e indissociável do negócio do Google.
Com base em algoritmos matemáticos, uma montanha de dados e uma diversidade global o Google sabe hoje ‘qual será o seu próximo click’ que chega a valer mais de R$ 100 para algumas palavras. E são para estes valores é que muitas empresas estão olhando. Elas compreenderam que os dados podem de alguma forma serem monetizados.
O que muito pouca gente se deu conta é que não basta ter toda esta capacidade. Indiscutivelmente os buscadores, em especial o Google, literalmente transformaram a maneira como nos relacionamos com as informações, com as empresas e com outras pessoas. A informação hoje está literalmente a distância de um click. A grande questão é a quem estas informações estão a serviço.
Quando uma empresa reúne dados de clientes para algum tipo de proteção comercial, temos a formação dos chamados de Serviços de Proteção de Crédito. Quando estas empresas começam a vender estes dados para ações comerciais ativas (diferente do fim pelo qual foram reunidos inicialmente) isto começa a gerar um incômodo social. Já tivemos os primeiros movimentos disto também.
Este cenário fica mais interessante quando surge uma empresa querendo proteger o cliente de outra empresa, falando ainda sobre o uso de dados.
É dentro deste contexto que as legislações sobre privacidade de dados se intensificam.
Da mesma forma que as ondas não seguem padrões externos, a Privacidade é maior do que as leis que as regem. As leis são referências para que possamos compreender e seguir alguns acordos sociais a fim de que a coisa não descambe.
Tenho sugerido que se a empresa olha em primeiro lugar para si (como autoconhecimento) e seguidamente para seus clientes, ela estará no caminho certo.
Se os dados são coletados, armazenados, analisados e utilizados em benefício do cliente, restará pouca dúvida sobre o que deve ou não ser feito. A discussão se inicia quando a empresa resolve utilizar os dados exclusivamente em seu benefício. Ai, nada mais justo, do que o cliente receber a sua parte. Afinal, onde fica o equilíbrio?
Voltando ao surf, ter todo o conhecimento do mundo habilitará a pessoa a se tornar duas coisas: um comentarista ‘mala’ de surf que entende tudo do esporte, mas nunca surfou; ou, com alguma pouca prática, um surfista medíocre que sabe tudo sobre o esporte, mas não é capaz de realizar as manobras básicas.
Mesmo os melhores surfistas são vistos porque, de alguma forma, são um exemplo de experiência de vida esportiva. O bom surfista se ‘entrega’ à onda. Às vezes é difícil saber quem está surfando quem!
Este é, na minha leitura, o bom jogo comercial, quando empresa e cliente se aproximam cada vez mais. Quando o conhecimento é utilizado em primeiro lugar para servir ao cliente, bem como à empresa. A isto chamo de um Bom Relacionamento com Clientes.