O comando do PSDB anunciou, há pouco mais de um mês, que o partido se tornaria “oposição” à gestão Jair Bolsonaro, mas, na Câmara, a decisão foi ignorada, e os deputados do partido passaram a votar ainda mais alinhados ao governo do que antes do anúncio. As orientações do líder da bancada, Rodrigo de Castro (MG), também começaram a coincidir mais vezes com as do Palácio do Planalto.
A ida do PSDB à oposição foi uma resposta às declarações de Bolsonaro durante os protestos de 7 de Setembro. Na Avenida Paulista, em São Paulo, e na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, o presidente insultou o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes e disse que não mais cumpriria decisões dele. No dia seguinte, o PSDB lançou nota repudiando “as atitudes antidemocráticas e irresponsáveis adotadas pelo presidente”.
No mês anterior, quando o PSDB se identificava como “independente”, a Câmara realizou 70 votações nominais nas quais o líder do governo, Ricardo Barros (Progressistas-PR), orientou voto a favor ou contra o projeto em pauta. Nessas votações, o líder do PSDB indicou que sua bancada se posicionasse da mesma forma que a orientação de Barros em 53 vezes, ou 75,7% do total. No mês seguinte à ida do partido para a oposição, as orientações de Castro coincidiram com as do governo em 34 das 39 votações – ou 87%.
Na maioria das vezes, os parlamentares não são obrigados a seguir a orientação do líder, mas as indicações de Castro resultaram num aumento do “governismo” dos deputados do PSDB. No mês passado, dos 1.828 votos de parlamentares tucanos, 1.332 (72,8%) seguiram o que queria o Palácio do Planalto. Depois de o partido virar oposição declarada a Bolsonaro, a porcentagem pulou para 88,3%.
Entre os congressistas há reclamações sobre a forma como o presidente do PSDB, Bruno Araújo, encaminhou a ida do partido para a oposição, sem consultar a bancada. Os deputados só foram chamados dias depois, quando a decisão já tinha sido anunciada. Procurado, Araújo não se manifestou até a conclusão desta edição
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Um exemplo do descontentamento foi a declaração do deputado tucano Pedro Cunha Lima (PB), presidente do Instituto Teotônio Vilela (ITV), fundação vinculada ao partido. Dias depois do anúncio, ele disse discordar da decisão e afirmou que não faria “oposição sistemática” a Bolsonaro.
Nem todos os deputados do partido, no entanto, estão contentes com o “governismo” do PSDB. “Como é que pode um partido que quer ter candidato à Presidência da República ter uma bancada que se comporta desse jeito? Não pode haver essa subserviência”, afirmou o deputado Danilo Forte (CE), que defende a posição de votar a favor das pautas econômicas em temas como privatizações e reformas. “Agora, do ponto de vista da política, do comportamento, o PSDB tem uma pauta contrária.”
O alinhamento da bancada tucana ao governo foi evidenciado na disputa pela presidência da Casa, no início do ano, quando a maior parte se aliou a Arthur Lira (Progressistas-AL), candidato do Planalto. Ao menos metade da bancada tucana também foi contemplada no ano passado com repasses de emendas de relator, base do chamado orçamento secreto. Pelo esquema, revelado em maio pelo Estadão, o governo destina bilhões em recursos do Orçamento para cidades indicadas pelos parlamentares sem qualquer critério técnico ou de transparência. O mecanismo de “toma lá, da cá” foi criado pelo governo Bolsonaro para aumentar sua base de apoio no Congresso.
‘Coerência’
Para Rodrigo de Castro, não há “subserviência”. Segundo ele, é o Congresso que tem liderado as principais iniciativas desde o início da pandemia. “Mantemos a coerência com aquilo que historicamente defendemos e, nas questões ideológicas, não nos submetemos à pressão de quem quer que seja”, disse.
Apesar do que diz o líder tucano, o PSDB tem votado conforme a orientação do governo também em pautas “políticas”. Na proposta que previa a impressão dos votos – uma bandeira de Bolsonaro -, por exemplo, a bancada se posicionou majoritariamente pela aprovação da medida. Também há alinhamento em projetos de autoria do Executivo, e não do Congresso.
Para a cientista política especializada em temas do Legislativo Beatriz Rey, o aumento do “governismo” pode ser interpretado como uma reação à decisão da Executiva. “Esse tipo de rebeldia é algo que acontece bastante em parlamentos (de outros países) e é bastante estudado pela ciência política”, disse ela.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo. Por André Shalders e Camila Turtelli – Estadão Conteúdo
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